As águas do Brasil

Texto por: Publicado em: 27 de agosto de 2024

Nesta edição da Revista Agro Magazine, abordamos projetos que têm como base a preservação ambiental por meio de programas como o Produtor de Águas que é realizado em todo o país pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e parceiros. Outras ações, com o mesmo propósito, são observadas na Serra da Mantiqueira e no Cerrado. Essas ações são essenciais para a manutenção dos rios que abastecem cidades, alimentam animais e atendem as demandas do agronegócio.

Destacamos nesta matéria projetos em andamento que, junto com as demais editorias da revista, mostram as muitas ações que poucos veem, mas que são essenciais para a preservação da vida em nosso país.

Que os projetos de preservação sejam inspiração para muitos outros! Se você tem um projeto na sua região, envie seu caso de sucesso para a Revista Agro Magazine. Vamos somar forças na divulgação de bons exemplos de preservação ambiental.

Queimadas

Durante o fechamento desta edição, aconteceu uma série de queimadas por todo o país, gerando caos e pânico em estados como São Paulo, Minas Gerais e Goiás. Os incêndios de grandes proporções deixaram prejuízos (ainda incalculáveis), causaram acidentes e afetaram a saúde de milhares de pessoas.

Mesmo atravessando um período de seca e altas temperaturas, o que já deixa em alerta para os possíveis riscos naturais de queimadas, a quantidade de focos foi superior ao registrado nos últimos anos, levando à investigação de possíveis incêndios criminosos. As queimadas são consideradas crime ambiental e podem resultar em multa e prisão.

A mudança climática é uma realidade, o aumento da temperatura é vivenciado por toda a população, mas ações humanas sem a conscientização podem provocar o caos como o registrado nos dias 23 e 24 de agosto/2024. Jogar bituca de cigarro nas rodovias, queimar lixo urbano, limpar terrenos com fogo são ações que, associadas às condições climáticas e aos ventos, podem levar a grandes queimadas que dificultam o controle das chamas pelo homem. Que os bons exemplos a seguir sejam o destaque da próxima estação de seca!

Mata Atlântica

Foi no município de Extrema\MG que surgiu o primeiro programa Produtor de Águas, com a metodologia por pagamentos pelos serviços ambientais prestados (PSA), o Conservador das Águas de Extrema, projeto premiado nacional e internacionalmente. Implementado há mais de 20 anos, inspirou muitos outros que conheceremos a seguir como o Conservador da Mantiqueira, uma iniciativa coletiva que une agentes na esfera pública, no terceiro setor, em instituições de ensino e no setor privado em prol do mesmo objetivo: promover a restauração florestal de milhões de hectares em todo o território do bioma Mata Atlântica no Brasil.

O projeto surgiu após a experiência da expansão do já consagrado projeto municipal Conservador das Águas de Extrema, implantado em 2005. O Conservador da Mantiqueira atua em 425 municípios nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.

Reconhecida como uma das mais ricas áreas em biodiversidade do mundo pela Revista Science, a Serra da Mantiqueira — composta por florestas e campos naturais, se estende pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais — é o lar da maioria das espécies presentes na Mata Atlântica e possui a maior concentração de água mineral do planeta.

Rio Jaguari

Com os excelentes resultados obtidos, com diversos municípios mobilizados e vários projetos-piloto implantados, criaram-se condições para a restauração de 1,5 milhão de hectares, bem como a ampliação do trabalho para toda a área brasileira da Mata Atlântica. Isso impacta positivamente mais de 3.400 municípios em 17 estados, demonstrando a importância de ações conjuntas para atividades locais, a fim de implementar medidas mais efetivas de combate às mudanças climáticas e de melhoria da segurança hídrica, que vão muito além da conservação ambiental.

O projeto apoia municípios na criação de normas, leis e programas para a restauração, inclusive auxiliando na ampliação da capacidade técnica para a implementação das ações através de capacitações, isto é, construindo cada passo em conjunto. A natureza não tem fronteiras, por isso o plano segue impactando centenas de municípios e com expectativa de chegar a milhares de cidades, utilizando metodologia, sucesso e experiência de mais de 20 anos do Conservador das Águas de Extrema.

Para o idealizador do programa, o biólogo Paulo Pereira, ver os resultados conquistados ao longo dos anos e a ampliação do projeto é motivo de orgulho. “Dediquei-me, nos últimos 30 anos, para construir um projeto robusto e deu certo. Nosso compromisso é apoiar outros municípios a construir os seus projetos, o caminho está trilhado”, observa.

Águas da Mantiqueira

 E com o crescimento das ações, outros projetos foram sendo criados como o Águas da Mantiqueira, fruto de uma parceria entre Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio (Fundepag) e Fundação Toyota do Brasil. O projeto tem os mesmos propósitos, visando à conservação da biodiversidade, planejamento territorial e desenvolvimento socioeconômico de forma sustentável em municípios da Serra da Mantiqueira. Estabelecido em 2017, o Projeto Águas da Mantiqueira é um trabalho de pesquisa de longa duração centrado em inventários de biodiversidade e recursos hídricos, sendo utilizado como base para o planejamento do território de pequenos municípios.

O planejamento territorial integra áreas naturais, rurais e urbanizadas para a garantia de serviços ecossistêmicos — principalmente a água e o clima — essenciais para regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro.

Atualmente, o projeto é desenvolvido em seis municípios: Santo Antônio do Pinhal (SP), São Francisco Xavier (distrito de São José dos Campos/SP), Águas da Prata (SP), Sapucaí-Mirim (MG), Gonçalves (MG) e Baependi (MG), organizando o planejamento territorial em 196 bacias hidrográficas delineadas e um Programa de Restauração Ecológica e Biocultural em 50 hectares, localizados principalmente em áreas de preservação permanente.

“Essencial para a sustentabilidade, segurança hídrica e manutenção do clima, o Programa de Restauração Ecológica do Projeto é centrado em diferentes estudos de biodiversidade para práticas de manejo que facilitem a regeneração natural de áreas degradadas, permitindo o retorno de espécies arbóreas, arbustivas, herbáceas com grande eficiência, bem como da fauna de diversos grupos da Mata Atlântica. Em paralelo, contribui para o desenvolvimento de programas  de interpretação da natureza, promovendo o conhecimento público da diversidade biológica e dos três importantes valores da natureza: econômico, psicológico e intrínseco”, explica o coordenador técnico do Projeto Águas da Mantiqueira, José Roberto Manna de Deus, que complementa: “O valor econômico está ligado aos serviços ecossistêmicos, o psicológico ao bem-estar resultante do contato com a natureza e o intrínseco é o valor da biodiversidade independente de benefícios aos seres humanos”.

Equipe multidisciplinar

Uma equipe de 30 pesquisadores trabalha em diversas áreas do conhecimento, como: biologia da conservação, hidrologia, agronomia, arquitetura e urbanismo, saúde, educação, história ambiental. Essa diversidade de áreas traz um conhecimento amplo do território e da avaliação dos impactos da conversão da paisagem natural em áreas rurais e urbanizadas, como base para a gestão sustentável do território no presente e no futuro.

Os recursos financeiros, equipamentos e trabalho para o desenvolvimento do Projeto são providos pela Fundação Toyota do Brasil e Fundepag, além de diversos outros parceiros e colaboradores.

A Serra da Mantiqueira tem a maior concentração e diversidade de água mineral do mundo, a exemplo das águas ferruginosas e sulfurosas, reconhecidas pelo seu valor medicinal. Além de prover a hidratação e o bem-estar humano e de todas as espécies, estão localizadas na Serra da Mantiqueira as nascentes do Sistema Cantareira (que abastece diariamente mais de 7,5 milhões de pessoas) e do Rio Grande, responsável por formar o Rio da Prata e o Rio Paraná, este o segundo maior em extensão na América Latina e um dos maiores do mundo.

Cerrado

O Bioma Cerrado é o segundo maior da América do Sul, onde ocupa uma área de 2.036.448 km2, correspondente a mais de 22% do território nacional e é constituído, principalmente, por savanas. Esse bioma abrange os estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Paraná, São Paulo e Distrito Federal, além dos encraves no Amapá, Roraima e Amazonas.

O Cerrado contém três das maiores bacias hidrográficas da América do Sul, (Tocantins-Araguaia, São Francisco e Prata) o que, de certa maneira, favorece sua biodiversidade. A paisagem do bioma é predominantemente caracterizada por extensas formações savânicas, interceptadas por matas ciliares ao longo dos rios, nos fundos de vale.

As árvores do bioma são muito peculiares, com troncos tortos, cobertos por uma cortiça grossa, cujas folhas são geralmente grandes e rígidas. Muitas plantas herbáceas têm órgãos subterrâneos para armazenar água e nutrientes. Os problemas mais comuns no Cerrado são normalmente causados pelo fogo, tanto na forma de incêndios naturais como os causados pelo homem.

Café Produtor de Águas

O Programa Café Produtor de Água é uma estratégia construída com base na constante busca por sustentabilidade na cadeia produtiva do café, bem como da necessidade da revitalização ambiental das bacias hidrográficas nas quais estão inseridas as regiões produtoras de café, muitas delas na região do Cerrado.

Além disso, tem por objetivo criar um ambiente favorável ao estabelecimento de parcerias entre entidades que atuam no segmento da cafeicultura, com vistas a viabilizar a implementação de práticas e manejos conservacionistas e de melhoria da cobertura vegetal, que contribuam para o abatimento efetivo da erosão e da sedimentação, e para o aumento da infiltração de água no solo. Outro ponto importante é que o programa contribui para promover a recomposição das matas ciliares.

No Sudoeste de Minas Gerais, além do Programa Produtor de Águas, desenvolvido em vários municípios e que já gerou pagamento pelos serviços de preservação ambiental prestados por produtores rurais, instituições apoiam programas específicos para a preservação de áreas, como o Conselho Nacional do Café (CNC).

O CNC, juntamente com parceiros como a Cooperativa Regional dos Cafeicultores em Guaxupé (Cooxupé), prefeitura, Emater e outros, implementou em Alpinópolis/MG, o projeto-piloto Programa Café Produtor de Água, cujos produtores que participam do projeto já receberam pelos serviços prestados. O sucesso gerou a sua ampliação e, em 2024, foi implantado no município de Monte Carmelo/MG.

Segundo o presidente do CNC, Silas Brasileiro, esse projeto visa à preservação dos mananciais, das matas ciliares e a conservação das estradas para escoamento da produção e, também, evita o assoreamento de rios e nascentes. “Esse projeto mostra ao mercado a preocupação do Brasil, como maior produtor de café do mundo, em preservar também seus mananciais” disse ele.

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