Os avanços da cadeia produtiva do leite e seus desafios

Texto por: Publicado em: 18 de janeiro de 2024

A cadeia produtiva do leite é uma das atividades socioeconômicas mais importantes do Brasil. Produzido em quase 99% dos municípios brasileiros, o leite é responsável pela geração de emprego e renda para milhões de pessoas. Nas últimas cinco décadas, a  atividade passou por uma grande evolução. De 1974 a 2023, a produção de leite aumentou em cinco vezes passando de 7 para 35 bilhões de litros anuais. Já o rebanho de vacas ordenhadas cresceu menos de 50%. Na última década, ocorreu uma queda consistente nesse indicador, que hoje é inferior a 16 milhões de animais, mesma quantidade que no início da década de 1980. Essa relação se refletiu no aumento da produtividade animal, que mais que triplicou no período, chegando aos 2.200 litros/vaca. Tal aumento expressivo da produção, bem acima do nível de crescimento da população, permitiu ao país saltar de um consumo anual de 100 para quase 180 litros por habitante/ano, disponibilizando mais leite, de melhor qualidade e a um menor custo para os consumidores. Esses avanços foram possíveis devido aos ganhos de produtividade dos recursos empregados na atividade, frutos da adoção tecnológica ao longo da cadeia.

Apesar de toda essa evolução, a produção nacional encontra-se praticamente estagnada desde 2014, o mesmo acontecendo com o consumo per capita, resultado de um ambiente macroeconômico complicado, com recessão econômica em 2015 e 2016, pandemia em 2020 e um baixo crescimento médio da renda per capita do brasileiro. Com essa conjuntura de mercado desafiadora vivenciada nos últimos anos, somente os produtores mais eficientes têm conseguido se manter na atividade gerando renda e bem-estar para suas famílias. Essa situação é preocupante devido a outra característica marcante do leite, que é a forte presença de pequenos produtores, visto que 98% deles possuem produção inferior a 500 litros por dia. Além disso, ao contrário de outros setores do agronegócio brasileiro, o setor lácteo é historicamente importador líquido de leite e derivados. Em 2023, essa situação se agravou com a aceleração das importações, que atingiram um recorde histórico. Como a produção de leite brasileira é voltada quase que exclusivamente para o mercado doméstico, essa entrada expressiva de leite importado associada ao fraco desempenho do consumo interno, derrubou as cotações do leite ao produtor e comprometeu a rentabilidade da atividade.

Para 2024, o cenário de mercado ainda é bastante desafiador, mas algumas questões conjunturais podem ajudar a cadeia a ter um ano mais positivo. Medidas adotadas pelo governo federal para reduzir as importações e a destinação de linha de crédito especial para capital de giro aos produtores, associadas aos dados mais favoráveis da economia brasileira, com crescimento do PIB, inflação controlada e desemprego em queda, podem ajudar a equilibrar o mercado.

Entretanto, é fundamental que o Brasil desenvolva inteligência estratégica de modo a orientar políticas públicas e ações estruturantes para fortalecimento da competitividade da cadeia. Assim, será possível definir medidas estruturantes de curto, médio e longo prazo para fortalecimento da cadeia, por meio do aumento da eficiência dos produtores e da indústria nacional, além de permitir ao Brasil aproveitar as suas vantagens competitivas e as oportunidades no mercado internacional, inserindo-se de forma competitiva como exportador de lácteos.


Elizabeth Nogueira Fernandes
Chefe-geral da Embrapa Gado de Leite

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