A presidente da Embrapa

Texto por: Publicado em: 27 de outubro de 2023

Nesta primeira sessão de entrevista para o site AgroMagazine, ouvimos a primeira presidente mulher da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), Silvia Massruhá. A conquista da pesquisadora abre espaço para muitas outras mulheres, que se preparam para liderar empresas no campo ou na cidade. Silvia Maria Fonseca Silveira Massruhá é mineira, de Passos, e assumiu a presidência da Embrapa no ano em que a instituição completou 50 anos da sua criação.

Neta de agricultor e filha de professores, a educação moldou a sua trajetória. Graduada pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Silvia seguiu-se especializando. É doutora em Computação Aplicada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), onde apresentou a tese “O modelo de inteligência artificial para diagnóstico de doenças de plantas”. É também mestre em Automação pela Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação pela Unicamp e graduada em Análise de Sistemas pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Entre suas áreas de conhecimento, está o desenvolvimento de tecnologias para sistemas complexos ou para soluções interdisciplinares portadoras de futuro, que se materializa no uso de ferramentas como Inteligência Artificial, “blockchain” e Internet das Coisas (IoT), entre outras.

Silvia assumiu a presidência da Embrapa no dia 1º de maio de 2023 e, nos últimos cinco meses, atuou de forma intensa nos muitos compromissos que a sua função exige. Nesta entrevista ela retrata os seus desafios profissionais, o apoio da família e os enfrentamentos atuais dos produtores e produtoras rurais. Vale a pena conferir. Boa leitura!

AM – A EMBRAPA, instituição da qual é presidente, completou 50 anos. Nesse meio século, você assumiu o cargo da primeira presidente mulher da entidade. Como profissional de carreira da empresa, qual o significado de ocupar este cargo, neste momento, em que o protagonismo do trabalho feminino ganha força?

SM – Este convite tem um significado muito grande para mim, dado que sou pesquisadora da Embrapa há 34 anos. É o reconhecimento de toda uma carreira técnica e gerencial. Ao mesmo tempo em que esta posição coroa a minha trajetória na empresa, traz uma responsabilidade muito grande por ser a primeira mulher a ser presidente da Embrapa. Espero que essa oportunidade inspire e incentive outras mulheres na gestão da empresa e na agropecuária brasileira.

AM – Como pesquisadora, acreditava que esta conquista seria possível?

SM – Como pesquisadora, sempre vi a capacitação como peça fundamental para evoluir na carreira e dediquei-me ao mestrado e ao doutorado. Quando entrei para o cargo de gestão, também procurei me capacitar em cursos de governança e gestão. Acredito que com foco e capacitação podemos almejar qualquer posição nas empresas. Entretanto, eu não havia pensado em assumir este cargo até o momento em que recebi o convite do Ministro da Agricultura e Pecuária.

AM – Em pesquisa realizada por este site, a capacitação é uma das grandes demandas das produtoras rurais. Você se capacitou ao longo da sua jornada. Qual a sua mensagem para as produtoras que estão em busca de capacitação?

SM – A capacitação é a base para podermos evoluir e agregar valor nos sistemas de produção. É fundamental que os produtores invistam em capacitação para poderem vislumbrar outros modelos de negócios e aumentarem sua renda.

AM – Sua trajetória está ligada ao uso da tecnologia, da computação, do digital, na agricultura. Como esse trabalho foi desenvolvido ao longo da sua trajetória?

SM – Desde que entrei na Embrapa, em 1989, me dediquei à computação aplicada à agricultura. Meu mestrado foi na área de engenharia de software, um estudo de caso na área de pecuária de leite, e o doutorado na área de Inteligência Artificial aplicada ao diagnóstico de plantas. Coordenei vários projetos na área de engenharia de software e inteligência artificial. De 2009 a 2015, atuei como Chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Informática Agropecuária. De 2015 a 2022, atuei como Chefe Geral da Embrapa Informática Agropecuária, que a partir de setembro de 2021, sob minha gestão, passou a se chamar Embrapa Agricultura Digital.

AM – Temos muitas ferramentas para auxiliar o trabalho do produtor rural, mas na sua análise o que falta nesse segmento para ser ofertado ao homem do campo?

SM – Na minha visão, falta um programa de capacitação para mostrar para o produtor rural como a tecnologia pode agregar valor em um sistema de produção, reduzir custo ou melhorar a gestão. É preciso fortalecer e dar mais articulação para a extensão rural pública e privada.

AM – Nesses cinco meses como dirigente da EMBRAPA, você já participou de muitas missões, representou a empresa em vários eventos. O que você destaca nessa troca de experiência?

SM – A Embrapa este ano completou 50 anos e é uma referência em agricultura tropical para o mundo todo. Em qualquer país em que chegamos, o trabalho desenvolvido pela Embrapa nestes 50 anos é reconhecido e abre oportunidades de muitas parcerias.

AM – As suas especializações foram na área de Inteligência Artificial. Como todo esse processo tecnológico vai ajudar os produtores nos próximos anos?

SM – Hoje, já utilizamos a IA para o diagnóstico de doenças de plantas, estimativa de safra, contagem de frutos, biometria animal, monitoramento do uso e cobertura da terra, entre outras áreas.

AM – Quais os desafios da presidente da Embrapa para os próximos meses?

SM – Temos que avançar em algumas pautas como segurança alimentar no nosso país e no mundo; sustentabilidade nas três dimensões: econômica, ambiental e social; transição nutricional; saúde única; transição energética; fortalecer as ações de bioeconomia nos seis biomas brasileiros; inclusão socioprodutiva e digital do pequeno e médio produtor. Precisamos também trabalhar na modernização da Embrapa, com frentes como descentralização, desburocratização e revisão do processo de gestão de pessoas. Temos também que fortalecer os recursos da pesquisa agropecuária. Hoje, a Embrapa está com 15% de recursos que estava há 10 anos.

AM – A tecnologia, com seus avanços, facilita a vida do produtor rural. Mas, nem todos têm acesso. Como fazer chegar essa tecnologia aos médios e pequenos produtores?

SM – Por exemplo, a Embrapa está com um projeto denominado Semear, financiado pela Fapesp, que visa à inclusão digital do pequeno e médio produtor. O projeto visa criar dez distritos agrotecnológicos no país, para diferentes culturas e sistemas de produção, com três pilares principais: conectividade, capacitação e empreendedorismo, explorando áreas de pesquisa como inteligência artificial, geotecnologias, automação e rastreabilidade. Ações como essas são fundamentais para dar acesso a conhecimento, tecnologia e mercado.

AM – Neste veículo de comunicação, falaremos sobre o trabalho das produtoras rurais de Minas Gerais. Qual a sua mensagem como pesquisadora, mãe, esposa e presidente da Embrapa para as produtoras rurais?

SM – As mulheres estão, cada vez mais, tendo espaço na sociedade, no campo e na gestão. As mulheres podem trabalhar assumindo seus diferentes papéis na vida pessoal e profissional. Entretanto, temos que ter foco para atingirmos nossos sonhos e nos capacitar para alcança-los com maestria e obtermos o reconhecimento por meritocracia. Hoje, na posição de presidente da Embrapa, sinto-me muito honrada pelo reconhecimento dos meus 34 anos como pesquisadora e 14 anos como gestora. Espero que a minha trajetória inspire outras mulheres e, principalmente, as minhas filhas. Karina, que é médica, finalizando a residência em Neurologia, e Júlia, cursando faculdade de medicina. Mas nada disso não seria possível sem o apoio da minha família, principalmente do meu esposo, com quem estou há 32 anos.

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